E a vida vai seguindo. Um dia levamos vantagem, e noutros, as desvantagens se apresentam sem cerimônias. E o lançamento de filmes sempre são uma cerimônia, não é?
E uma série de desvantagens (em meio a escolhas erradas e equivocadas) não fizeram nenhuma cerimônia com o filme “Maníaco do Parque”.
E as vantagens simplesmente não apareçam. (E perceba que falo que elas não “desapareceram”, elas NEM apareceram)
Maníaco do Parque é um filme dirigido por Maurício Eça (que já se debruçou em outro caso real de crimes em A Menina Que Matou os Pais, sobre o caso Suzana Richthofen) e conta – pela visão do diretor – o caso de Francisco Pereira, assassino que chocou o Brasil no final da década de 1990.
Maurício Eça: Diretor parece ser especialista em performances artísticas de qualidade questionável. Cartaz: Divulgação
A história é apresentada pelo ótica de uma jornalista (personagem fictícia) que investiga e busca incansavelmente por resposta sobre o caso. Ela é funcionária do famigerado jornal “Notícias Populares” e a direção narrativa (errando muito), opta por não produzir uma cena ou diálogo para melhor situar e contextualizar o que representou o estilo jornalístico do popular jornal “espreme que sai sangue”.
A invenção da personagem jornalista Elena vivida por Giovanna Grigio, que segundo o próprio realizador foi uma maneira de evitar a fetichização do assassino e dar força à voz feminina, deu uma volta e só reforçou a ausência de coragem em fazer um filme respeitável.
Cito pelo menos dois aspectos que enfraquecem a produção: 1) O uso da trilha sonora musical como narrador é um desastre de clichês e más escolhas;
2) A cena “padrão” em filmes de suspense ou drama – o olhar repentino de surpresa – por duas vezes no filme é uma das cosas mais mal elaboradas já feitas em um filme.
Giovanna Grigio: Até percebe-se que atriz tem qualidades, mas não foi dessa vez. Cartaz: Divulgação
Soma-se aos infortúnios artísticos de Maníaco do Parque, a difícil tarefa de competir com dois filmes muito bem produzidos, sobre o exato mesmo tema, lançados quase simultaneamente: “A Garota da Vez” e o surpreendente e impactante “Strange Darling”.
Em dois minuto de cena em A Garota da Vez (cena no estacionamento após o programa de namoros) carrega-se mais tensão e envolvimento que em todo filme brasileiro. E em relação a Strange Darling e seus hipnóticos desdobramentos estéticos e narrativos, não há como poupar a obra nacional de uma comparação crítica desproporcional.
Mire-se, cinema nacional: Irretocável, o filme Strange Darling. Cartaz: Divulgação
INTERVALO 1
(Isso sem falar que o uso da trilha sonora musical em Strange Darling é impecável)
INTERVALO 2
(Marjorie Estiano, também em um novo filme nacional recém estreado – “Abraço de Mãe” – faz o tal “olhar repentino de surpresa” com maestria)
“Abraço de Mãe”: Marjorie Estiano salvando o cinema nacional de gênero. Cartaz: Netflix
Ainda sobre Maníaco do Parque, Silvério Pereira é um bom ator, e já demonstrou isso em gêneros cinematográficos diversos, mas para viver o criminoso assassino no novo filme, parece só ter cortado o cabelo do selvagem personagem Lunga de Bacurau (2019) e foi em frente. (E no meio de tantos equívocos narrativos e estéticos ao seu redor, às vezes ele até parece tentar dar o brilho que o filme não alcança)
O cinema e a literatura sempre experimentaram inventar/criar personagens e envolvê-los em histórias reais, acontecimentos históricos verdadeiros, etc, como se fossem um guia para o espectador ou leitor do que se passa na trama. Não deu certo para esse novo filme nacional.
O jornalista e roteirista Mauro Ferreira tenta em vão uma defesa. O único. Imagem: Instagram
Nesse novo filme, tudo parece uma simulação mal feita daquele velho programa “Fala que eu te escuto” das madrugadas televisivas. Não há como carimbar de outra forma: o filme “Maníaco do Parque” é muito ruim. (HD)
Poxa! Que texto bem elaborado e bem construindo. crítica muito bem balanceada e humor sempre pontual do HD.