Registrei pouquíssimas críticas escritas até agora e quase ninguém comentando sobre a série “Teacup” (2024), porém, se prepare para essa surpresa. (Hoje, quarta, dia 06 de novembro e só está começando…)
Em seu primeiro trailer compartilhado no último mês de outubro, essa novidade do canal Peacock (streaming da Universal Pictures) possui uma trama que acompanha um grupo de pessoas – moradores de uma área rural – que precisa se unir para enfrentar uma ameaça (supostamente) maligna, desconhecida (sim) e mortal (sim também). Tudo aquilo que o paranoico ama odiar, hã?.
Casais em conflito, idosos, crianças, todos invadidos por uma ameaça que ninguém sabe ao certo de onde vem e o que querem. Isso obviamente, cria o cenário perfeito para desconfianças, revelações e conflitos, os mecanismos humanos perfeitos para desordem paranoica.
Teacup: Família em conflito com inimigos internos e externos. Imagem: Divulgação
Guiados sob a etiqueta James Wan (Invocação do Mal e Jogos Mortais), e claro, imagino também por uma mesa de roteiristas hábeis (os tais showrunners), os criadores vão pouco a pouco (episódio a episódio) construindo personagens que, mesmo numa história fantástica ou sobrenatural, conseguem conexão com os espectadores.
(Me lembrou bastante as sensações de The Walking Dead em sua máxima fase criativa)
A paranoia no audiovisual quase sempre foi e continua sendo alimentada pelo que podemos chamar de “sinais dos tempos”.
O artista de nome impronunciável, um dia chamado de Prince, diz em sua canção sobre o assunto que “você tem que cair fora”. E não é isso que o paranoico sempre busca, fugir para longe do que ele carrega na própria mente?
Dica de leitura: Leia, pesquise e descubra como funciona uma mente paranoica. Imagem: Arquivo pessoal
E falando em música, Teacup rege com harmonia o uso da música como auxiliar narrador, indo de Heart of The Country (Paul McCartney em seu disco Ram) até Everybody Knows This Is Nowhere (Neil Young em seu disco homônimo). (Chupa, Brasil!)
De um cinema, digamos, mais recente como em Eles Vivem (1988), Os 12 Macacos (1997), Amnésia (2000), Ilha do Medo (2010), O Abrigo (2011) e Coherence (2013) – só clássicos paranoicos – até um retorno ao seminal Vampiros de Alma (1956), passando pelas séries O Fugitivo (1963/1967) e Os Invasores (1967/1968), o audiovisual foi craque em traduzir o medo oriundo das concepções conspiratórias.
(Arquivo X que o diga, hein, Mulder, o crente e Scully, a cética?)
Cheios de paranoia: Protagonista em “Vampiros de Alma” correndo por suas vidas. Imagem: Divulgação
Voltando para nossa série Teacup, vamos criar nossa própria paranoia? (Fácil, fácil!)
Acima, não citei à toa como uma espécie de referência narrativa o seriado The Walking Dead, pois o final do último episódio em Teacup é o puro suco imagético da história de Rick Grimes na famosa série de zumbis.
Entre as duas séries, – percebi isso nesse exato instante – existe também a grande coincidência de que suas histórias se passam inicialmente no Estado norte-americano da Geórgia.
O Estado é considerado um dos “swing states”, local decisivo para eleições presidenciais no país. (Trump, no momento dessa publicação já foi eleito novo presidente). Material para as próximas paranoias teremos em abundância daqui pra frente.
Bicho Papão nos EUA: Se correr o bicho pega e se ficar o bicho come. Imagem: Divulgação
Mais uma vez, exemplificando como os sinais do (seu) tempo influenciam, as produções cinematográficas das décadas de 1950 e 1960 – filmes B ou de baixo orçamento – abusaram da mistura entre ficção científica e a paranoia comunista, criaram monstros, alienígenas e criaturas mutantes em suas abundantes sessões grindhouse.
Entre os já citados, destaco o filme “Vampiros de Almas”, lançado no clímax da paranoia resultante da Segunda Guerra (Guerra Fria), que se por um lado em sua metáfora, parece evidenciar que os seres alienígenas invasores da terra poderiam ser a representação da invasão comunista, a mesmíssima ameaçadora invasão poderia ser considerada como se um grupo autoritário e conservador quisesse transformar a todos em uma só unidade (preconceituosa) de pensamento.
Isaac Asimov Magazine e uma resenha sobre “Vampiros de Alma”: Comunista ou conservador? Imagem: Arquivo Pessoal
Aproveito para mencionar novamente a grande produção irradiadora da sensação paranoica nas telas, e que até hoje, influencia obras correspondentes: “Os Invasores”, estrelada pelo pai dos personagens paranoicos, o arquiteto David Vincent.
Escreva o que estou dizendo (pois já estou escrevendo aqui): nos próximos anos teremos muitas inspirações para o espírito paranoico que já se apresenta e fortalece. Lembra dos sinais dos tempos?
“Ei, David Vincent, me leva com você” diz a canção. Imagem: DVD Divulgação
Deixei aqui para o final, a informação de que Teacup ainda está sem previsão de estrear no Brasil. Fiz isso para não perder você, o leitor, logo no começo do texto.
Chamo isso de truque retórico, discursivo, sei lá… Mas na verdade foi uma leve e desesperada paranoia de um escritor sensato. (HD)