Eis que surge uma daquelas vilãs acidentais que adoramos odiar.
Não atrapalha em nada, possuir logo de cara essa informação sobre a personagem principal em “Disclaimer”, série baseado em livro de mesmo nome e em exibição no Apple TV+. (E também em sua reta final)
INTERVALO: Um “disclaimer” meu… Até agora, sem acreditar na equipe criativa que batizou a série em português de “Pura Coincidência”.
Aqui no Brasil já é cansativo ouvir a palavra que originalmente batiza a série, diante de seu uso exagerado em palestras coach ou por comunicadores que querem parecer descolados. Num guento!
FIM DE INTERVALO
Posso afirmar que é uma série fascinante. A narrativa mistura uma boa dose de novela brasileira em sua mais perfeita forma (aqui leia-se: nada dessas péssimas novas novelas), mistério, romance, infortúnio e drama.
Diretor da série Alfonso Cuarón (braços cruzados) com equipe da série: Imagem: Festival de Vezena
Indo em pontos mais específicos, em nada fica devendo a qualquer intrincada clássica tragédia grega ou dilemas humanos da celebrada literatura russa.
Na trama, Catherine (Cate Blanchett), uma premiada jornalista/documentarista, recebe um livro de um autor desconhecido em que a personagem principal da história possui segredos nebulosos e estranhas semelhanças com seu passado.
Curiosa por descobrir a identidade do autor, ela finge, manipula e é forçada a confrontar seu passado, correndo risco de perder tudo que construiu em sua bem-sucedida carreira.
Medo da verdade: Queimar o passado não o faz desaparecer. Imagem: Divulgação
Olha só. Realmente esqueça, as recentes adaptações ruins de Harlan Coben (escritor especialista em mistérios e rei das séries de suspense), o talento para o melodramático de Sidney Sheldon e suas adaptações capengas, porque o mexicano Alfonso Cuarón domina bem a direção em Disclaimer.
Ao redor de todo mistério que circunda o passado da personagem de Blanchett, orbitam outros tantos personagens muito bem construídos pela decepção, a vergonha, o ódio, o rancor e a vingança.
Kevin Kline, Sacha Baron Cohen, Leila George, Lesley Manville e Kodi Smit-Mcphee fazem esses papéis com rigorosa habilidade dramática. Não há qualquer traço de insegurança interpretativa ou naturalidade defeituosa.
Kevin Kline: Um pai em busca obsessiva para juntar os cacos que não colam mais. Cartaz: Divulgação
Uma perfeição também é a combinação temporal e narrativa que visita passado e presente e apresenta gradativamente os caminhos da revelação, da perdição, da calamidade e da ruína.
Hoje (sexta, 1º de novembro) vai ao ar o penúltimo episódio. Não sei realmente o que esperar do desfecho desse dilema. Um detalhe curioso é a profusão de narradores – literalmente como se estivessem lendo um livro – intercalando os acontecimentos.
Essa escolha narrativa me deixa inquieto diante de uma possibilidade (suspeita) que prefiro não compartilhar para não me adiantar e arruinar em você leitor, a experiência desse retumbante dramalhão.
Leila George: Uma beldade amaldiçoada. Vale tudo por algumas noite de paixão? Imagem: Divulgação
Poderíamos discutir muitas coisas diante das pequenas e audaciosas escolhas da personagem Catherine que acarretam grandes consequências na vida de muitos.
Seduzir e se entregar a tórridos desejos seriam superpoderes? Posso dizer que o desejo pode ser uma ruína. (HD)