
TRIVIA (nível médio): De que filme é esse still?. Imagem: Divulgação
Já começo apertando: você saberia dizer de onde saiu a imagem que serve para ilustrar a manchete desse texto? (Tô rindo muito aqui do sua cara tentando identificar!)
Quer saber uma verdade inaudita?: Artistas cinematográficos aproveitam uma indisposição e má vontade de ver ou rever filmes antigos, muito comum nos dias de hoje, para enganar (ou despistar) novas plateias com novas obras “originais”.
O limite não é o céu, mas nossa ignorância.
(Nota do escritor: Nesse caso, a “sua”, a “nossa”, mas nunca “a minha” ignorância)
Vamos pra dois imitões conhecidos para entendermos como funciona:
1) Brian De Palma: Vestida Para Matar é praticamente Psicose com um toque do giallo de Dario Argento e Dublê de Corpo é Janela Indiscreta + Um Corpo Que Cai (ambos Hitchcock), só que com pornô leve e sofisticado;
De Palma “vestido para imitar”: Meia tigela não… Ladrãozinho de tigela cheia. Imagem: Divulgação
2) Quentin Tarantino: Roubou tanto (alguns alegam “inspiração”) e na cara dura – mas roubou bem – que podemos até reconhecer como “exercício de influência”. Em Cães de Aluguel afanou “City on Fire” (1987), Kill Bill é puro Lady Snowblood – Vingança na Neve (1973) e por aí vão os apetrechos de filmes (que provavelmente você nunca viu) e que Tarantino “roubou!”.
“Quem faz a fama, deita na cama”. De Palma e Tarantino se esparramam em leito king size.
Mas isso é do jogo.
Em seu livro, Tarantino “confessa” seus roubos. Um gênio da roubalheira estética. Imagem: O Globo
Quem, por exemplo, vê muitos dos filmes policiais da década de 1970 (alguns bem desconhecidos por aqui), logo vê que anos 80, 90 e 2000, pouco é uma novidade que já não tivesse sido feito.
Vejam ou revejam, por exemplo, Thriller – A Cruel Picture (1973), O Parceiro Silencioso (The Silent Partner/1975), O Sanguinário (Sitting Target/1972), The Super Cops (1974) ou Aviso de Dois Minutos (Two-Minute Warning/1976).
Mas esses dias topei com alguns “filmes favoritos” de Wes Anderson, que aliás, isso deve ter acontecido pois acaba de estrear em Cannes seu novo “O Esquema Fenício”.
Anderson é o mesmo cara dos maravilhosos “Os Excêntricos Tenenbaums” (2001), “A Vida Marinha com Steve Zissou” (2004), o lindo e hilário “Hotel Budapeste” (2014) e o meu preferido, “Moonrise Kingdom” (2012).
E dentro dessa perspectiva, destaco, pois acabo de perceber diante de sua lista, que o cinema histriônico, onírico, gaiato, delicadamente caricato e personalíssimo de Anderson, como um personagem de Shyamalan, sofre estetização de personalidade múltipla.
Confira parte da lista:
Quai des Orfevres (1947)
Sweet Smell Of Sucess (1957)
The 400 Blows (1959)
The Man Who Loved Women (1977)
My Life to Live (1962)
The Plot Against Harry (1989)
Gemas da história do cinema. Porém gemas que provavelmente ninguém vê mais, ou quem já viu tá morto.
Eu também tô morto. Mas morto de vergonha de vocês que nunca viram esses filmes.
Noves fora as qualidades dessas obras, percebe-se facilmente como elas “contaminaram” os filmes de Wes Anderson. Claro que também ressalto a capacidade de reinvenção excêntrica da melhor qualidade do cineasta norte-americano.
Anderson comandando seu elenco infantil no romântico e tocante Moonrise Kingdom. Imagem: Divulgação
Mas também não discordo que tanto Anderson como De Palma e Tarantino, usados com referência aqui, tenham chegado em pontos de esgotamento, como se estivessem presos dentro da própria obra numa repetição de substância e estilo.
Esse é um risco real de quem paga pra ver. (hahahaha… Aqui literalmente, pagar pra ver (no cinema) esses “filmes referência”)
Por fim e de qualquer maneira, o mais importante é que isso me faz acreditar na seguinte teoria: Não acredite em cineastas que não assistem filmes. (E eu já ouvi em Teresina um fazedor de filme local dizer que não gosta de ver filmes)
Lembro aqui, dentro da mitológica história de um dos maiores cineastas brasileiros, nosso José Mojica Martins (Zé do Caixão), uma ocasião em que ele começou a ler livros sobre como fazer cinema e foi veementemente proibido por um amigo de estudar sobre o assunto. Ele obedeceu.
E ele aprendeu só vendo filmes.
Velhos filmes, novos filmes, releituras ou reinvenções, sejam assumidas ou disfarçadas, se a arte imita a vida, a vida na arte também é revivida.
E eu que nunca pensei que pudesse pensar ou dizer: “Querido artista… Não leia livros!”. (HD)